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O que é FATO e o que é FAKE sobre o uso de defensivos agrícolas no Brasil

É FAKE que o Brasil é o maior consumidor do mundo de defensivos agrícolas?
É FATO que o Brasil é líder mundial em controle biológico na agricultura?

Luciana Paiva e Leonardo Ruiz

Uma frente fria invadiu o Centro-Sul do Brasil na primeira semana do último mês de agosto. No dia 3, um sábado, a capital paulista registrou a tarde com menor temperatura de 2019, com média de 12,9 graus. O clima esfriou ainda mais com a chegada da noite, geada e até a neve marcaram presença em alguns pontos do país.

O frio intenso foi um convite para as famílias ficarem em casa e desfrutarem as atrações da TV. Foi assim que milhões de telespectadores conferiram o clássico de Monteiro Lobato “O Sítio do Picapau Amarelo se transformar na paródia “O Sítio do Picapau com Sequela”.

O esquete produzido pelo programa humorístico Zorra Total, da Rede Globo de Televisão, fez uma sátira ao uso de defensivos agrícolas no Brasil. Ressaltou as consequências dos defensivos e o impacto de algumas decisões políticas, como a liberação dos mais de 300 defensivos pelo atual governo federal.

Na sátira, os produtores rurais e a bancada ruralista são apontados como responsáveis pelo uso exagerado de defensivos, ameaçando a saúde dos consumidores.

“Borrifada na goiaba para agradar a tal bancada” - é a primeira frase da música tema do esquete, que destaca que em decorrência do uso dos “agrotóxicos” “o Saci criou três pernas, Rabicó ficou doente, Dona Benta matusquela e a Emília ficou banguela”.

A intenção era fazer humor, mas nem todos riram, principalmente os produtores rurais.  A Associação Brasileira dos Produtores Exportadores de Frutas e Derivados (Abrafrutas) divulgou uma nota de repúdio: “... lamentamos a irresponsabilidade dos editores do programa Zorra da Rede Globo de Televisão que, por completo desconhecimento técnico do tema do uso de agroquímicos para controle de pragas e doenças das frutas, levou ao ar uma sátira sobre esse assunto sugerindo uma visão totalmente equivocada da realidade do campo...” , destaca parte da nota divulgada pela Abrafrutas.

Nem todos riram com a Sátira do Programa Zorra Total: Sítio do Picapau com Sequela

Crédito: TV Globo

Foto: Divulgação MAPA

A ministra Tereza Cristina (Agricultura, Pecuária e Abastecimento) também se pronunciou. “É inadmissível que o agronegócio brasileiro tenha tido, nessa última semana, um bombardeio pela mídia nacional, colocando o alimento produzido no Brasil como inseguro, o que não é verdade”, afirmou a Ministra ao participar da abertura do Congresso Brasileiro do Agronegócio, promovido pela Associação Brasileira do Agronegócio (ABAG), em 5 de agosto na cidade de São Paulo.

A reclamação da Ministra não seu limitou à paródia produzida pelo Zorra Total, se estendeu para as diversas reportagens divulgadas na mídia, ao longo dos nove meses de 2019, com críticas ao registro de defensivos agrícolas no governo Bolsonaro.

Em relação ao tema, Tereza Cristina afirmou que o fato de “a fila de registros [de defensivos agrícolas] andar mais rápido traz tecnologia e segurança. E não o atraso, como querem colocar a pecha no agronegócio brasileiro. Nossos concorrentes devem estar adorando a situação.” Segundo ela, dos 262 produtos registrados [até o momento do Congresso da ABAG], apenas sete são novos. Os demais seriam genéricos ou equivalentes aos já existentes no mercado.

Tereza Cristina: "Nós não liberamos agrotóxicos. Nós concedemos registros para a produção industrial de formulados.”

Notícias infundadas afetam o mercado de frutas brasileiras

Foto: Divulgação Abrafrutas

Ao criticar por meio de sátira o uso de defensivos agrícolas no Brasil, o programa Zorra Total baseou-se nas muitas notícias divulgadas pela mídia que colocam o Brasil como o maior consumidor desse tipo de produto. Para integrantes do setor agrícola, esse comportamento da imprensa, pode representar má fé, mas principalmente é fruto de desconhecimento sobre o tema.

“A maioria das notícias são infundadas, isso ocorre por falta de conhecimento técnico e científico em relação à necessidade do uso de defensivos agrícolas. Na verdade, o Brasil não é um grande utilizador de defensivos por hectare, é um dos maiores utilizadores em termos absolutos porque detém uma das maiores agriculturas do mundo, principalmente agricultura tropical. É preciso ressaltar que boa parte de nossos grãos é plantada no sistema de plantio direto, no qual é necessário secar a palha. Para isso, utiliza-se glifosato, um herbicida, também considerado defensivo. Em outros países, não acontece o plantio direto, é feito aração, o que eleva o consumo de combustível fóssil, e, com isso, a maior liberação de CO2 e mais problemas de erosão do solo”, observa Luiz Roberto Barcelos, presidente da Abrafrutas.

Segundo Barcelos, essas informações equivocadas têm provocado prejuízo à fruticultura brasileira. “Essa campanha midiática atrapalha muito. Nós como exportadores de frutas temos recebido várias mensagens de importadores preocupados com as notícias sobre o uso e liberação de defensivos no Brasil. Também o mercado interno é afetado, pois, os consumidores, assustados reduzem o consumo de frutas por receio do uso de agroquímicos. Gerando problemas de saúde pública em decorrência de um medo infundado”.

“A maioria das notícias são infundadas, isso ocorre por falta de conhecimento técnico e científico em relação à necessidade do uso de defensivos agrícolas”, afirma Luiz Roberto Barcelos, presidente da Abrafrutas

Barcelos explica que esse receio dos consumidores em relação ao uso de defensivos na fruticultura, acontece porque as frutas vão praticamente direto do campo para a mesa do consumidor, não passam por um processo de industrialização, o que deixa mais exposto o uso de defensivos. “Mas não há razão para esse medo, utilizamos produtos registrados e na dose indicada. Tanto que não há registro no país de pessoas que tenham ido a óbito por ingestão de frutas com agroquímicos.”

O presidente da Abrafrutas, salienta que a fruticultura brasileira é bastante tecnificada, comparada as mais desenvolvidas do mundo. “Utilizamos estritamente o necessário, optamos por defensivos mais seletivos, que atacam principalmente as pragas alvo, moléculas menos nocivas. Realizamos pulverizações à noite, promovemos rotação de cultura, manejo integrado de pragas entre outras ações que garantam uma fruticultura que não agride o meio ambiente e a saúde humana. Também é preciso destacar que não somos grandes utilizadores de defensivos, pois boa parte da produção vem de pomares que não são renovados todos os anos, não necessitando do uso de secantes.”

A imprensa e o uso de defensivos agrícolas no Brasil

Como tentativa para levar às redações informações, inclusive técnicas, sobre as atividades do campo, a ABAG, em conjunto com outras entidades do setor, criou um Workshop para Jornalistas que cobrem o agronegócio. Durante o evento realizado no mês de agosto, foi apresentado um estudo feito pela Unesp de Botucatu, baseado em dados da FAO, Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação mostrando que, na comparação entre dólar investido em defensivo agrícola e tonelada de alimento produzido, o Japão é líder com o valor de US$ 95,40 por tonelada de alimento produzido, ficando o Brasil na 13ª posição, com um gasto de US$ 8,10 por tonelada.  

VOLUME DE AGROQUÍMICOS UTILIZADO
POR HECTARE PLANTADO (kg/ha)

11,75

4,59

2,4

1,9

1,16

Fonte: FAO e Banco Mundial

QUILOS DE ALIMENTOS PRODUZIDOS
PARA CADA DÓLAR INVESTIDO EM
AGROQUÍMICOS

142

94

51

8

Fonte: Kleffmann Group

Os dados da FAO sobre uso de defensivos agrícolas, foram apurados pela consultoria de mercado Phillips McDougall. O trabalho é utilizado como referência tanto pelas indústrias do setor agroquímico, quanto por especialistas da área e ambientalistas.

 

O relatório compara o valor investido em pesticidas nos 20 maiores mercados globais em 2013. A pesquisa mostra que, naquele ano, o Brasil foi o país que mais gastou com agrotóxicos no mundo: US$ 10 bilhões. Estados Unidos, China, Japão e França ficam, respectivamente, nas posições seguintes.

 

O Brasil aparece em primeiro lugar em número absoluto, mas segundo Caio Carbonari, professor da Unesp de Botucatu, e autor do estudo, o país ocupa o 7º lugar em uso de defensivo agrícola por hectare de área cultivada e fica em 13º quando se analisa o consumo de agrotóxico por volume de produto agrícola. “O dado que coloca o Brasil na primeira posição em número absoluto não reflete a realidade e não comunica absolutamente nada, além de ser baseado em um dado equivocado, pois quando se divide o consumo de agrotóxico brasileiro pela área plantada dilui-se esse volume gigantesco e isso faz com que o Brasil fique lá embaixo no ranking. O uso de agrotóxicos no Brasil, expresso em US$/ha ou US$/t produzida, é inferior da maioria dos países relevantes ao ponto de vista agrícola.”

Foto: Arquivo CanaOnline

A fruticultura brasileira é bastante tecnificada, comparada as mais desenvolvidas do mundo

Para Hamilton Ramos, pesquisador científico do Centro de Engenharia e Automação do Instituto Agronômico (CEA-IAC), órgão da Secretaria de Agricultura e Abastecimento de SP, é necessário se ater com o uso que se faz das estatísticas. Ele dá como exemplo: “O Brasil é o maior consumidor mundial de agrotóxicos. Isso é fato, mas é natural que seja assim. Afinal é um grande país agrícola e o único a fazer duas a três safras em uma mesma área. Comparar diretamente o uso do Brasil com o do Japão, por exemplo, não é lógico e, para se poder comparar, deve-se trazer os números para uma mesma base: por exemplo, dividindo-se o consumo por área plantada ou por toneladas de alimentos produzidos. Qualquer que seja a ponderação feita, o Brasil nem de longe está entre ou primeiros”, afirma.

O clima é determinante no uso de defensivos agrícolas

Foto: Elizabeth de Almeida Alves

Em relação à influência do clima e o uso de defensivos agrícolas, o pesquisador Ramos alerta ser um fato enganoso considerar que: se os produtos não são recomendados na Europa não deveriam ser também em nosso país. “Brasil e Europa são diferentes, com necessidades distintas para culturas e climas. Para exemplificar, pense que uma pessoa compre 1 kg de carne e o divida em duas porções iguais: uma ela coloca no freezer e outra ela mantém em cima da pia da cozinha. Obviamente, aquela em cima da pia se degradará mais rapidamente que a do freezer. O mesmo acontece também com produtos químicos no ambiente, climas mais frios podem prolongar o tempo necessário para degradação e conferir um problema ambiental ao produto que não será realidade em climas tropicais.”

O mesmo frio, no início de agosto, que “convidou” a população a ficar em casa assistindo TV, deixou em alerta os produtores rurais para a ocorrência de geadas. A região de Monte Alto, no estado de São Paulo, estava entre as áreas que registraram uma fina camada de gelo sobre a vegetação.

Foi o que ocorreu na fazenda Rumo, que conta com uma área de 57,51 hectares, que na última safra produziu 5.527 toneladas de cana com média de produtividade de 96,10 tch, colhidas em canaviais de 1º ao 7º corte. Sendo que a área de 7º corte registrou 87 t/c/h. O segredo para a alta produtividade por vários cortes começa pelos olhos dos donos, por isso, a família Farinelli, proprietários da fazenda, pulou cedo da cama para conferir se a geada havia afetado os canaviais. Alívio, o gelo atingiu superficialmente a cana, sem provocar danos.

A ausência de frio ou neve é um dos benefícios do clima tropical, além da alta incidência de chuvas. Por outro lado, essas condições contribuem para a maior proliferação de pragas, doenças e plantas daninhas. Aumentando o uso de defensivos agrícolas, o que não ocorre nos país frios. Assim, muitos defensivos utilizados no Brasil não são utilizados na Europa, por não ser necessário em função do inverno rigoroso.

Foto: Arquivo CanaOnline

A produção de frutas nas regiões semiáridas necessita de menor uso de defensivos agrícolas

Barcelos, presidente da Abrafrutas, confirma que as condições climáticas têm um peso considerável para o maior ou menor uso de defensivos agrícolas. “Boa parte das frutas produzidas no Brasil acontece na região do semiárido – Vale do São Francisco nos estados da Bahia e Pernambuco; Mossoró no Rio Grande do Norte; e Norte de Minas Gerais – o clima mais seco reduz a quantidade de pragas e leva ao menor uso de defensivos. A produção de frutas, legumes e verduras nesse ambiente, onde se faz necessário o uso da irrigação, tem sido uma tendência mundial, ocorre no Sul da Espanha, na Califórnia, em Israel...”

Legislação brasileira para registro e uso de defensivos químicos é bastante rigorosa

Foto: Instituto Nacional de Processamento de Embalagens Vazias (inpeV)

Carlos Goulart, diretor do Departamento de Sanidade Vegetal e Insumos do Ministério da Agricultura (Mapa) observa que a lei brasileira para o registro e uso de defensivos agrícolas é muito rigorosa. Existem regras para ser utilizado, assim como qualquer outro medicamento. O produto é analisado pelo Mapa, Anvisa e Ibama, e precisa comprovar que funciona agronomicamente, não agride o meio ambiente e a saúde humana.

O pesquisador Ramos, do CEA-IAC, explica que durante o desenvolvimento dos estudos toxicológicos necessários para o registro de qualquer defensivo agrícola, são determinados, por meio de estudos padronizados e validados mundialmente, dois fatores importantes para o risco de consumo dos produtos agrícolas pela população: a IDA (Ingestão Diária Aceitável) que representa a quantidade de uma substância presente no alimento que pode ser ingerida todos os dias, durante toda a vida, sem causar nenhum efeito adverso à saúde (efeito crônico); e a DRfA (Dose de Referência Aguda) que representa a quantidade de uma substância presente no alimento que pode ser ingerida em até 24 horas sem causar nenhum efeito adverso à saúde (efeito agudo).

Foto: Divulgação

Nos estudos de campo, também na fase de registro, observa Ramos, são realizados ensaios de aplicação obedecendo-se as Boas Práticas Agrícolas (BPA) como dose correta, número de aplicações máximo por safra, dentro dos volumes de calda recomendados, respeitando-se o intervalo de segurança de colheita e, ao final do ciclo da cultura, uma amostra da produção é enviada a laboratório certificado para análise de resíduo presente na cultura.

O pesquisador conta que a partir dos resultados de resíduos obtidos nos ensaios realizados, estima-se o Limite Máximo de Resíduos (LMR), que é, por definição, a quantidade máxima de resíduos de agrotóxicos ou afins – oficialmente permitida no alimento – em decorrência da aplicação em uma cultura agrícola, expresso em miligramas do agrotóxico por quilo do alimento (mg/Kg).

Hamilton Ramos, pesquisador científico do Centro de Engenharia e Automação do Instituto Agronômico (CEA-IAC

Foto: Instituto Nacional de Processamento de Embalagens Vazias (inpeV)

Uma vez determinado o nível de resíduos, diz Ramos, ele será analisado em conjunto com o consumo (dieta da população), cujo dado no Brasil é dado pela Pesquisa de Orçamentos Familiares do IBGE, para se determinar o nível de exposição do consumidor. Esse nível de exposição é então analisado em relação a IDA e a DRfA para se determinar o risco de contaminação crônica e aguda desta ingestão. Caso a exposição seja maior que a IDA e/ou a DRfA, o LMR é inaceitável, e consequentemente, alguma alteração na BPA é necessária, como por exemplo a redução no número de aplicações permitidas por ciclo, como forma de reduzir este LMR. Se a exposição permanecer maior que a IDA e/ou a DRfA, não se estabelece LMR para o cultivo em questão e consequentemente não há o seu registro. Caso seja aceitável, este LMR poderá ser proposto no registro. Neste caso, o nível de exposição do consumidor será transformado em %IDA e uma nova cultura só poderá ser recomendada e colocada no rótulo de qualquer defensivo se a somatória de todas as porcentagens para as culturas para as quais é recomendado não ultrapassar 100% da IDA.

“Dessa forma comparar LMR ou julgar que um resíduo encontrado acima do LMR trará consequências à saúde da população não é muito lógico. Se os LMR entre países são diferentes, significa que eles têm recomendações diferentes de aplicação o que leva a resíduos diferentes, mas, ambas foram colocadas no processo de avaliação e se mostraram seguras. Também, uma LMR acima do limite indica que as BPA não foram adotadas na produção, mas não que representa, necessariamente, um risco a saúde do consumidor, uma vez que isso irá depender também do nível de consumo daquele alimento” observa Ramos.

As exigências das certificações para o uso de defensivos agrícolas

Foto: Leonardo Ruiz

Canavial e laranjal na fazenda Santa Cruz e Pau D’Alho os primeiros do Brasil com a certificação SAI

Luiz Roberto Barcelos, presidente da Abrafrutas, observa que  não é logico utilizar maior dose de defensivos ou aplica-los de forma errada, esses equívocos significam perda, aumento de custo, e o produtor não quer gastar mais. Além disso, aumentam as exigências do mercado para produtos agrícolas rastreados e certificados. O uso correto de defensivos é um dos critérios para a obtenção das certificações.

Está localizada em Bebedouro, no interior paulista, a primeira propriedade agrícola do Brasil a ter seus canaviais e laranjais certificados pela SAI (Social Accountability International), uma certificadora de sustentabilidade europeia. Trata-se da fazenda Santa Cruz e Pau D’Alho, que conquistou o selo nível ouro da SAI, atestando que as operações conduzidas na propriedade, respeitam critérios pré-estabelecidos nas esferas social, ambiental e tributária. A Santa Cruz e Pau D’Alho também faz parte do seleto grupo de apenas 10 fazendas particulares que ostentam a certificação Bonsucro em seus canaviais.

Patrícia Marta Matarazzo, proprietária da Fazenda, tem sua gestão baseada na sustentabilidade, por isso, não abriu mão de investir e adequar sua propriedade para atender os padrões das certificações. Ela conta que o uso de defensivos agrícolas está entre os critérios avaliados para a certificação. “O primeiro item que verificam são os registros dos produtos para as culturas, se não forem registrados a certificação não sai. Conferem também se as aplicações são feitas com critério, isto é, de acordo com inspeções e índices pré-definidos”, conta a produtora.

A agrônoma Juliana Farinelli, sócia da AgroVerde Consultoria e Treinamentos, empresa que assessorou Patrícia para a adequação e conquista das certificações, observa que em relação aos defensivos agrícolas, realmente, o primeiro critério avaliado é se o produto é registrado para a cultura que será utilizado. A profissional destaca também outros itens: o produto não pode estar inserido na lista de defensivos proibidos nacional e internacionalmente, obedecendo o Protocolo de Montreal, a Convenção de Estocolmo, a Convenção de Rotterdam e Organização Mundial da Saúde; é preciso respeitar cuidados inerentes ao trabalhador que manipula e aplica defensivos, armazenamento, aplicação entre outros; respeitar o período de carência de reentrada dos defensivos na lavoura informado na bula - que é o intervalo de tempo entre a aplicação e a colheita ou comercialização; realizar as aplicações de defensivos em situações ideais de clima, sem vento e nas horas mais frescas do dia. “Algumas certificações também restringem a quantidade aplicada de defensivos na lavoura por hectare/ano, por exemplo, na Bonsucro este indicador não pode ser maior que 5 kg de ingredientes ativo por hectare/ano”, salienta Juliana.

A preservação ambiental é levada muito a sério na Santa Cruz e Pau D’Alho, por isso, além de cumprir os critérios das certificações em relação ao uso de defensivos agrícolas, Patrícia busca alternativas de controle de pragas que sejam menos agressivas, como a pulverização biológica.Também está no seu radar eliminar as plantas daninhas por meio de uma máquina que dá choque no mato, fazendo com que ele seque, assim, não precisará usar glisofato.

Foto: Leonardo Ruiz

“O primeiro item que verificam são os registros dos produtos para as culturas, se não forem registrados a certificação não sai”, informa Patrícia

Inovações tecnológicas contribuem para o uso racional de defensivos agrícolas

A pulverização aérea de defensivos agrícolas surgiu como uma operação que proporciona diversos benefícios, como rapidez e melhoria da qualidade das aplicações, eficiência no controle de pragas, redução de custos e aumento da produtividade agrícola. No entanto, a atividade corre o risco de ser proibida, em decorrência de transtornos que pode provocar, como os problemas de deriva – quando uma nuvem do produto se desloca para fora da faixa de aplicação, atingindo e contaminando outras áreas como urbanas, de preservação, colmeias, curso de água. 

O uso inadequado e até imprudente da aplicação aérea e, por outro lado, os danos que a proibição da prática irá causar para a agricultura, chamaram a atenção de dois jovens de São João da Boa Vista, no interior paulista. Eles se debruçaram sobre o tema e desenvolveram o Spray Plan, o primeiro sistema de análise lançado no mundo para monitorar a aplicação de agroquímicos por meio de aplicação aérea de defensivos agrícolas.

O sistema cria condições para a aplicação precisa, evitando a utilização de agroquímicos em faixas de proteção, situadas nas proximidades de áreas de preservação ambiental, núcleos residenciais, locais que abrigam organismos vivos, como populações do bicho-da-seda e colmeias. Relatórios documentam e comprovam inclusive os horários, locais e margens de segurança das aplicações.   

Os sócios da Dominus Soli, Antonio Loures e Marco Antonio Lino: tecnologia de ponta para a sustentabilidade do campo

Foto: Dominus Soli

“O Spray Plan é um sistema versátil e adaptável a diferentes necessidades de uma lavoura ou uma propriedade. Pode ser empregado para avaliações quanto à execução de uma aplicação aérea, por exemplo, tanto por drones como por aeronaves. Mensura qualidade da pulverização e também uma série de dados quantitativos. Outra utilidade diferenciada da ferramenta é mapear previamente, com riqueza de detalhes, as áreas que receberão tratamento fitossanitário por via aérea e as características gerais de seu entorno”, informa Antonio Loures, sócio da Dominus Soli, a empresa criada pelos dois amigos.

Pulverização aérea de defensivos proporciona diversos benefícios, como rapidez e melhoria da qualidade das aplicações, eficiência no controle de pragas, redução de custos e aumento de produtividade agrícola (Foto: Divulgação ANDEF)

Caso a pulverização aérea de defensivos agrícolas seja proibida, danos serão exponenciais

Foto: Arquivo CanaOnline

O uso de drones para a aplicação aérea está em ascensão, pois, segundo Marco Antonio Lino, sócio da Dominus Soli, são ideais e de fato transferem economia à aplicação quando empregados de maneira localizada, nas pequenas áreas, na chamada “catação”. “Nas áreas com essas características, a catação com emprego de aeronaves tende à imprecisão, em virtude da desproporção entre o tamanho reduzido de manchas ou reboleiras a se atingir com o tratamento e a alta velocidade imprimida pelas aeronaves no processo de aplicação dos produtos. Outra questão relevante nesse caso é a econômica, relativa ao valor final de um hectare tratado. No caso do emprego da aeronave, o tratamento é cobrado em horas de voo, já o drone em geral é contratado por um valor fechado, fixo.”

Já para as grandes extensões de lavouras, o uso do drone é limitado, ao menos neste momento. “Sabe-se, contudo, que há vários projetos em andamento para viabilizar tecnicamente a ampliação da capacidade de carga dos drones. Há ainda investimentos importantes da pesquisa agrícola para elevar a qualidade e a durabilidade de baterias dos drones, bem como para melhorar a propriedade de propulsão desses aparelhos. Acreditamos que obteremos diversos avanços quanto ao uso de drones em curto espaço de tempo”, afirmam os sócios da Dominus Soli.

Há investimentos em pesquisa agrícola para elevar a qualidade e a durabilidade das baterias dos drones, como para melhorar a propriedade de propulsão desses aparelhos

Foto: Leonardo Ruiz

Sprain Plan oferece laudos completos sobre a aplicação de defensivos

Foto: Dominus Soli

O Brasil é modelo no desenvolvimento de equipamentos de proteção aos aplicadores de defensivos

Aos pés da Serra do Japi, em Jundiaí, no interior paulista, encontra-se o Centro de Engenharia e Automação do Instituto Agronômico (CEA-IAC). É onde fica o Laboratório de Tecnologia de Aplicação de Agrotóxicos e Análises de Produtos Adjuvantes. Nesse espaço, o pesquisador Hamilton Ramos e sua equipe realizam estudos, avaliações, desenvolvimento de máquinas, implementos, componentes e insumos agrícolas, tecnologia de aplicação de insumos agrícolas, visando as boas práticas de aplicação e a segurança e saúde do trabalho no meio rural.

Pode se afirmar se tratar de um centro de excelência e inovação na área, tanto que reúne laboratórios como o de análise de vestimentas e luvas usadas para aplicação de agroquímicos no campo e pesquisas na área. O laboratório de luvas é o primeiro do mundo dedicado 100% à avaliação do produto e realiza análises com base na ISO 18.889, norma para certificações de luvas para defensivos agrícolas.

“Hoje o Brasil é modelo no desenvolvimento de equipamentos de proteção aos aplicadores de defensivos. Graças as ações integradas de pesquisa e governo, o Brasil foi o primeiro país no mundo a estabelecer normas

Foto: Leonardo Ruiz

de qualidade para este tipo de equipamento de proteção como lei. Ainda temos problemas no cumprimento da lei por algumas empresas, mas isso é crime, e não a realidade do Brasil”, informa Hamilton Ramos.

Em relação à qualidade da aplicação de defensivos agrícolas no Brasil, o pesquisador responde que depende do ponto pelo qual se olha. “Cerca de 95% de todo defensivo aplicado no Brasil está nas culturas de soja, milho, algodão, cana-de-açúcar, café e soja. Estas culturas são commodities e normalmente têm alta tecnologia, então, podemos dizer que a aplicação é muito boa. No entanto, as grandes propriedades onde são produzidos, apesar de representarem cerca de 80% da área plantada, representam menos de 1% do número de propriedades. Pelo outro lado, 5% de todo o defensivo aplicado no Brasil está nas outras culturas e em pequenas propriedades, onde a tecnologia via de regra não chega de forma adequada. Estas propriedades representam cerca de 3% da área plantada no Brasil, mas correspondem a cerca de 50% do número de propriedades. Assim, se olhar pelo lado da produção, estamos muito bem, mas se olhar pelo lado do número de pessoas, ainda temos muito a evoluir.”

Segundo Ramos, o que falta ao Brasil é melhorar o processo de qualificação dos profissionais em todos os níveis. “Os profissionais responsáveis por levar a tecnologia de aplicação aos produtores nem sempre estão preparados para isso, pois a faculdade via de regra não os prepara adequadamente, e ajudam a eternizar no campo problemas que levam, por exemplo, a um uso excessivo de produtos. Por outro lado, cerca de 80% dos aplicadores aprenderam a trabalhar com leigos, principalmente membros da família e outros agricultores, e nunca receberam um treinamento específico para o trabalho com agrotóxicos. Enquanto não tivermos um processo de qualificação eficiente e com linguagem adequada aos diferentes públicos alvo onde o indicador de qualidade seja a mudança de atitude e não o número de pessoas treinadas, estaremos fazendo sempre mais do mesmo.”

Confira vídeos sobre tecnologias e serviços desenvolvidos pelo CEA-IAC na área de aplicação de defensivos agrícolas

Programa desenvolvido pelo Centro de Engenharia e Automação do Instituto Agronômico (CEA-IAC) tem foco na formação de consultores para capacitar mão de obra ao uso correto e seguro de defensivos

Conheça o programa Adjuvantes da Pulverização realizado pelo Centro de Engenharia e Automação do Instituto Agronômico (CEA-IAC)

Tecnologia SprayX de computação vestível que orienta diretamente no campo, por imagem e comando de voz, aos técnicos responsáveis pela aplicação de defensivos agrícolas. O Sistema SprayX foi desenvolvido pelo Centro de Engenharia e Automação do Instituto Agronômico (CEA-IAC), órgão da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo, em parceria com a startup SprayX.

Foto: Instituto Nacional de Processamento de Embalagens Vazias (inpeV)

No Brasil, 90% das embalagens de defensivos agrícolas têm destinação adequada

De acordo com o Instituto Nacional de Processamento de Embalagens Vazias (inpeV), o Sistema Campo Limpo, desenvolvido pelo inpEV, já deu destinação adequada para cerca de 500 mil toneladas de embalagens de defensivos agrícolas desde 2001, quando foi criado.  O Brasil conta com 400 pontos de captação das embalagens e já atingiu o índice de 90% das embalagens com destinação adequada, percentual bem superior ao de vários países. Canadá e Alemanha, por exemplo, estão no nível de 70%, mas esses países não têm, como o Brasil, uma regra legal determinando que o produtor devolva a embalagem vazia. 

As embalagens vazias coletadas já são recicladas e transformadas em tubos para esgoto, dutos corrugados, artefatos para indústria automotiva e, recentemente, até novas embalagens para defensivos.

Brasil é campeão em controle biológico na agricultura

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Foto: Leontino Balbo Júnior

A vespa Cotesia flavipes parasitando a larva da Diatraea saccharalis, isso acontece no Brasil em 3 milhões de hectares com cana

Todas as espécies na natureza possuem inimigos naturais, uma forma de controle populacional conhecido por controle biológico, que tem como objetivo controlar as pragas agrícolas e os insetos transmissores de doenças a partir do uso de seus inimigos naturais. O controle biológico acontece espontaneamente na natureza ou, então, pode ser incrementado pela ciência - a produção é realizada em larga escala em laboratórios. Nesse caso, é chamado de controle biológico aplicado.

O professor do Laboratório de Biologia de Insetos do Departamento de Entomologia e Acarologia da Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” (Esalq/USP), José Roberto Postali Parra, salienta que a agricultura brasileira desenvolve o maior programa de controle biológico do mundo. “Nossas áreas tratadas têm grande extensão, na Europa, por exemplo, o controle biológico acontece em plantios dentro de estufas”, salienta.

O pesquisador destaca a cultura canavieira como a principal responsável por esse feito.  “A Cotésia flavipes, que é utilizada para o controle da Diatraea saccharalis (a broca-da-cana) na fase de lagarta, é liberada em mais de três milhões de hectares. Outros 500 mil hectares recebem a Trichogramma galloi para controle da broca na fase de ovo. E em mais de dois milhões de hectares com cana são utilizados inseticidas à base do fungo Metarhizium anisopliae para o controle da cigarrinha-da-raiz (Mahanarva fimbriolata).”

Liberação de cotesia flavipes
Trichogramma galloi
Joaninha predando pulgão
Controle biológico
Calossoma predando

Foto: Gerhard Waller (USP/ESALQ)

Parra observa que na cultura da soja, o fungo Trichoderma harzianum é utilizado em mais de cinco milhões de hectares para controlar o mofo branco, doença causada pelo fungo Sclerotinia sclerotiorum. Porém, proporcionalmente, o controle biológico na cana com o uso da Cotesia é maior, a área com soja no Brasil ultrapassa os 35 milhões de hectares, e a cana nove milhões, dos quais a terça parte recebe controle biológico.

O controle biológico também apresenta excelentes resultados na citricultura, onde a vespa Tamarixia radiata é utilizada para controlar o inseto transmissor do greening (huanglongbing/HLB), doença transmitida pelo inseto Diaphorina citri e que levou à erradicação cerca de 38 milhões de árvores no Brasil e quase dizimou a citricultura em vários países.

Também faz a diferença nos milharais, a Trichogramma pretiosum combate a lagarta-do-cartucho (Spodoptera frugiperda) e a lagarta-da-espiga (Helicoverpa zea). Na horta, principalmente nos tomateiros, quem faz sucesso é a Trichogramma atopovirilia que controla a traça-do-tomateiro (Tuta absoluta), a broca-pequena (Neoleucinodes elegantalis) e a broca-grande (Helicoverpa zea).

O pesquisador José Roberto Parra, salienta que a agricultura brasileira desenvolve o maior programa de controle biológico do mundo

Mas quando se fala em liberar em uma lavoura bilhões de insetos, bactérias, fungos ou vírus para combater pragas, muitos se perguntam se isso não é arriscado. Se esses organismos não podem eles próprios se transformar em pragas. Não, garante o especialista. Parra conta que desde que iniciou na atividade é perguntado sobre isso. “Tem semana que chego a responder três ou quatro vezes. Digo que não há perigo, o inseto entra em equilíbrio com sua presa."  No caso da Cotesia, por exemplo, se a população de lagartas decresce, a população de vespinhas também diminui. E sua liberação não provoca "efeitos colaterais": não são eliminadas outras espécies de insetos; não são poluídos o solo, a água ou o ar; não há contaminação de vertebrados, incluindo o ser humano.

Seja para atender o mercado ou produzir de forma mais sustentável, o produtor rural brasileiro investe cada vez mais em defensivos biológicos. A Associação Brasileira das Empresas de Controle Biológico (ABCBio) traçou um panorama, brasileiro e mundial, do mercado de defensivos biológicos. Que mostra que em 2018, o mercado brasileiro movimentou R$ 464,5 milhões, um salto de 77%, comparado com 2017. Em todo o país, essa solução já é aplicada em 10 milhões de hectares de um total de 77,4 milhões de hectares cultivados. Para a ABCBio, há muito espaço para cresce. No Brasil, estima-se uma expansão acima de 25% nos próximos cinco anos, contra 17% esperados no mercado global.

Foto: Alexandre Veloso

Brasil é líder mundial em controle biológico, com aplicação desse tipo de manejo em mais de 23 milhões de hectares e está exportando tecnologias da área para outros países - como liberação de inimigos naturais por meio dos drones

Acompanhando esta tendência, de 2009 a 2013, os defensivos biológicos e orgânicos representaram 13% do total de produtos registrados pelo MAPA, no período.  Considerando apenas o primeiro ano (2009), a proporção era de 1%. No segundo ano foi para 6,5% e, ao final daqueles cinco anos (2013), alcançou 21%, refletindo o avanço das tecnologias desenvolvidas nessa categoria de produtos.

Nos cinco anos subsequentes (2014 a 2018) a proporção continuou subindo, com os biológicos e orgânicos alcançando 30% do total de defensivos registrados. E praticamente a mesma fatia (29%) permaneceu na média dos últimos três anos (2016 a 2018), mostrando consistência histórica. Em dez anos (2009 a 2018), eles somaram 218 produtos registrados, representando 38% do total de formulados químicos liberados pelo MAPA.

O Correto é o Manejo Integrado de Pragas (MIP)

Foto: AEGRO

O pesquisador observa que, mesmo com o sucesso dos biológicos, para o controle mais completo das pragas é necessária uma abordagem abrangente, colocar em prática o Manejo Integrado de Pragas (MIP), aliado a um eficiente sistema de monitoramento, que deve ser empregado de maneira harmônica. “No momento preciso, devem ser empregadas diferentes medidas de controle, de forma a manter os níveis populacionais das pragas abaixo do nível de dano econômico.”

Parra defende o uso equilibrado dessas ferramentas de controle, utilizando os químicos de forma correta, sem superdosagem, com produtos registrados e com novas moléculas menos nocivas ao ambiente. E do lado do controle biológico, utilizar material com qualidade e as mais eficientes ferramentas de aplicação, com o uso de avião, drones e softwares que contribuem para a definição de quando realizar liberações, quantidade necessária e horários mais apropriados. É a ciência e a natureza jogando juntas para que o Brasil seja campeão na modalidade agropecuária sustentável.

FATO

E isso é FATO, não FAKE

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